A Operação Contragolpe, deflagrada pela Polícia Federal em novembro, revelou a organização criminosa que orquestrou tentativas de golpe e de abolição violenta do Estado Democrático de Direito. As investigações foram desencadeadas pelos eventos de 8 de janeiro de 2023 e vieram à tona uma semana após o atentado suicida em Brasília, que enfraqueceu a articulação política de anistia para os golpistas.
Que a democracia está sob ataque não é novidade, mas planejar o assassinato de Lula, Alckmin e Moraes nos choca, apesar de não ser exatamente uma surpresa. Os golpistas elogiam torturadores, propagam discursos de ódio e comemoram “CPFs cancelados“. Traçando um paralelo com o que o país viveu nos últimos anos, é possível afirmar que se trata de um plano em execução desde 2020, diante das evidências de crimes contra a saúde pública cometidos pela gestão bolsonarista durante a pandemia.
Braga Netto, vice derrotado e figura central na trama golpista enquanto Ministro da Casa Civil, esteve à frente do Comitê de Crise para Supervisão e Monitoramento dos Impactos da Covid-19. Como apontado pela CPI da pandemia suas ações e inações indicam a prática de crime de epidemia qualificado pelo resultado morte, denunciado pelo Conselho Nacional de Saúde à Procuradoria Geral da União
Além da ingerência do comitê, do “ministério paralelo” e da conivência com as ações de Jair Bolsonaro em desrespeito às medidas sanitárias, a atuação do general ficou marcada por sua participação em reunião com o Presidente da Anvisa para tentar incluir na bula da cloroquina o tratamento da covid-19.
Outro envolvido, Filipe Garcia Martins, foi preso em fevereiro deste ano, acusado de ter entregado a minuta do golpe para o então presidente. Filipe era assessor especial para assuntos internacionais e ficou conhecido em julho de 2021 por fazer gestos racistas em sessão do Senado. Ao longo da pandemia atuou na disseminação de desinformação, esteve presente em reunião sobre a compra de vacinas com o gerente-geral da Pfizer e Carlos Bolsonaro e está relacionado ao assessoramento paralelo na gestão da crise de saúde pública.
O Procurador-Geral da República, Paulo Gonet, “cogita reunir casos da trama golpista, das joias sauditas e do cartão de vacina em peça de acusação”, de acordo com a Folha. A notícia é alentadora, mas também é preocupante, por evidenciar que os crimes da pandemia seguem intocados, sem inquérito. Quantos paralelos existiram entre a antipolítica desempenhada durante a pandemia e a tentativa de golpe de Estado? Evidências mostraram que 391 mil mortes poderiam ter sido evitadas com uma gestão séria, baseada na ciência.
A comunidade científica, vítimas da covid-19 e seus familiares esperam que a nova PGR, com Gonet, avance nos procedimentos em relação às denúncias existentes. O Centro de Pesquisas em Direito Sanitário da Universidade de São Paulo (Cepedisa/USP) mapeou, em artigo publicado este ano, as ações que visam responsabilização administrativa, civil ou criminal, das quais grande parte foi engavetada, indicando a importância de retomá-las na forma de denúncias.
Em março de 2025, quando completam 5 anos da primeira morte por covid-19 no Brasil, será lançado pelo SoU_Ciência/Unifesp um acervo dos crimes da pandemia, com mais de 200 evidências, entre documentos, postagens, entrevistas e declarações que contribuíram para o aumento das mortes. Memória, verdade, justiça e reparação para os crimes da pandemia para que nunca mais ocorra o que vivemos!
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