Uma situação é inevitável ao olhar diretamente para as pessoas nas ruas do centro comercial de Ciudad del Este: uma ou algumas delas se dirigirão a você com as mais insólitas e perigosas propostas. Evitar contato visual desnecessário, porém, é só um dos cuidados que os turistas que estão em Foz do Iguaçu (PR) precisam ter ao cruzar a Tríplice Fronteira para fazer compras na cidade paraguaia ou em Puerto Iguazú, na Argentina.
Testar os produtos que comprou, não cruzar as fronteiras com os dois países com veículos alugados, ficar atento a eletrônicos e perfumes falsificados ou vencidos, fugir de camelôs, fazer sua lista de compras antecipada para ir focado e escolher bem um serviço de personal shopper estão entre as orientações e cuidados a serem tomados pelos turistas.
Dados da Secretaria do Turismo de Foz do Iguaçu apontam que a cidade recebeu neste ano 2,15 milhões de passageiros, dos quais 1,5 milhão pelo aeroporto e 647 mil via rodoviária. O Parque Nacional do Iguaçu —que abriga as cataratas— teve 1,51 milhão de visitantes, numa cidade que também tem como atrativos a hidrelétrica de Itaipu, o Parque das Aves, o Marco das Três Fronteiras, uma mesquita e um templo budista, entre outros.
Parte considerável desse fluxo, porém, tem como interesse o turismo de compras, atraído pelos baixos preços de outrora do Paraguai. Apesar do dólar acima dos R$ 6, ainda é possível encontrar produtos eletrônicos a preços atraentes.
O primeiro passo da viagem é como chegar ao país vizinho: em sites de locadoras de veículos, ao efetuar uma reserva para retirada no entorno do aeroporto de Foz do Iguaçu o cliente se depara com uma mensagem informando que, apesar de as fronteiras serem próximas, não é permitido deixar o Brasil com o carro alugado.
Numa cidade em que turistas reclamam muito de corridas canceladas por motoristas de aplicativo e que não oferece ao viajante a opção de usar um carro alugado, a opção é cruzar a ponte da Amizade, que liga o Brasil ao Paraguai, a pé, de ônibus, táxi ou usando serviços de agências. Com carro próprio, a recomendação é fazer a carta verde, que permite transitar pelo Mercosul.
É a partir desse momento que as atenções devem ficar redobradas, segundo agências de turismo e órgãos de repressão ao contrabando relataram à Folha.
“Desde a hora que você está passando a ponte, se for a pé, mas principalmente já no Paraguai, o assédio é muito latente. Se for de carro, é gente oferecendo estacionamento a todo momento, mas também é arriscado, já houve casos de sequestros. A recomendação é sempre comprar nos shoppings ou lojas mais conhecidas e estacionar em estacionamentos homologados nesses locais”, disse Luciano Stremel Barros, presidente do Idesf (Instituto de Desenvolvimento Econômico e Social de Fronteiras).
As compras envolvem as principais ciladas no lado paraguaio e é preciso ter em mente o que você vai comprar, lembrando que a cota é de US$ 500 (cerca de R$ 3.000) e que você pode ter de pagar excesso de bagagem, se chegou a Foz via aérea. Mapeie as lojas que vendem o que você quer e não acredite em preços muito abaixo da média, segundo Barros.
“Quem chega com cara de ‘perdido’ é a vítima preferencial de golpistas, que te levam para locais que vendem produtos de terceira linha ou falsificados e com preços em tese convidativos. Desconfie de preços muito baixos. Ter uma diferença de US$ 5 ou US$ 10 entre uma loja e outra acontece, mas US$ 50 ou US$ 100, não”, disse.
Comprou um eletrônico? Teste na hora, ainda que seja algo simples —as lojas têm um setor específico para isso. Se você detectar o problema só ao chegar ao hotel em Foz, ou à sua cidade de origem, será difícil trocar.
Da mesma forma, é preciso cuidado com moeda falsa no troco em alguma compra. Há lojas que aceitam pagamentos em reais, dólares e até mesmo Pix. No caso de dólares, nem todas as notas são aceitas: cédulas com grifos ou mesmo leves riscos à caneta são devolvidas pelos caixas das lojas aos consumidores.
Outro problema é com bebidas ou perfumes falsificados: é preciso buscar informações sobre a reputação da loja em que se pretende comprar. Além disso, a Folha encontrou em uma loja produtos de beleza coreanos à venda com desconto de 50%, mas que estavam vencidos. Questionada, a vendedora, brasileira, disse que era “por isso que estão mais baratos”.
LONGAS FILAS
Na Argentina, os problemas principais na região de fronteira envolvem o tempo para entrar no país, o risco de comprar por engano óleo de soja como se fosse azeite de ótima qualidade e até mesmo o perigo de abastecer com o combustível errado nos postos.
A chegada à Argentina é um desafio especialmente em temporadas, quando passar pela imigração pode levar até quatro horas para quem vai com veículo próprio. Não se esqueça de levar passaporte ou identidade com no máximo dez anos de emissão. Diferentemente do que normalmente ocorre no Paraguai, o documento é necessário na imigração argentina.
A opção mais barata e rápida é chegar de ônibus que faz a rota entre Foz e o município argentino. Ele fura a fila, porém os últimos horários disponíveis para retorno são por volta das 20h, o que inviabiliza o turista que quer jantar em Puerto Iguazú, um dos roteiros mais procurados pelos visitantes.
Há empresas de turismo que oferecem o destino com retorno no fim da noite e, ainda, transfers privativos, o que pode ser uma alternativa para quem tem pouco tempo e quer conhecer os principais atrativos.
O ideal é chegar à Argentina a partir das 16h, horário em que as lojas e restaurantes começam a reabrir depois da siesta. Ao caminhar pelas ruas, chamadas de “feirinha”, além de encontrar restaurantes com preços mais altos em relação aos praticados anos atrás, o turista deve tomar muito cuidado ao querer comprar azeites, especialmente os de embalagens de cinco litros.
“Ele é cheiroso, parece ser algo bom, o vendedor dirá que é um produto de alta qualidade, mas é muito ruim. É, na verdade, uma mistura de óleos”, disse Barros.
Se for com o próprio veículo, a principal dica do setor turístico é não se confundir caso precise abastecer o automóvel. Gasolina é chamada de nafta, e se o brasileiro pedir “gasolina” no posto o frentista pode entender gasoil (diesel).
QUANDO O BARATO SAI CARO
Além de não poder trazer uma quantidade de itens que configure comércio (como cinco perfumes iguais, por exemplo), ainda que dentro do valor permitido pela cota, há os produtos que são totalmente proibidos, como os cigarros eletrônicos. As apreensões no Brasil, só no primeiro semestre, já superaram o ano passado inteiro, e estão concentradas no Paraná.
“É proibido, não pode trazer nem uma unidade que seja”, disse o superintendente da PRF (Polícia Rodoviária Federal) no Paraná, Fernando Cesar de Oliveira. Eles são proibidos de serem comercializados no país por decisão da Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária).
A preocupação é compartilhada pelo presidente do FNCP (Fórum Nacional Contra a Pirataria e a Ilegalidade), Edson Vismona, que acompanha o mercado ilegal de todos os produtos há duas décadas.
Em valores atualizados, a pirataria causa um prejuízo anual superior a R$ 200 bilhões ao país. “O que entra no país ilegalmente provoca sonegação e impacta as nossas indústrias.”
Por fim, a orientação das autoridades é declarar logo na aduana da Receita Federal em Foz as compras que excederem a cota de US$ 500 e pagar imposto de 50% sobre o valor excedente. Isso significa que numa compra de US$ 600, o turista vai pagar 50% sobre os US$ 100 que superaram a cota —US$ 50, no caso.
Se não fizer isso e for parado na chamada zona secundária com produtos que superam a cota —rodovias no entorno de Foz ou a fiscalização no aeroporto—, o turista não terá mais a chance de fazer a declaração e o pagamento do imposto e perderá sua compra.
Vai seguir viagem terrestre no Brasil após a viagem de compras? Última dica de órgãos de segurança: jamais deixe as compras expostas no interior dos veículos.
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