Com um discurso cauteloso frente ao receio de esgarçar a relação com a Venezuela, o Brasil voltou a pedir que o país dê salvo-conduto aos seis asilados da oposição que vivem na embaixada da Argentina. Ou seja, que permita que eles saiam do país sem detê-los.
A defesa se deu na OEA (Organização dos Estados Americanos), em Washington, nesta quarta-feira (11). A sessão foi convocada pelo governo de Javier Milei para pedir ações urgentes contra o cerco que forças de segurança de Caracas produzem na sede diplomática há três semanas.
“O governo brasileiro vem atuando para viabilizar a concessão de salvos-condutos para os asilados. O tema vem sendo objeto de tratativas, em alto nível, envolvendo as autoridades venezuelanas” disse o embaixador Benoni Belli, representante brasileiro no órgão.
O Brasil assumiu os cuidados da sede diplomática argentina e, portanto, dos asilados, desde que em 29 de julho, um dia após a contestada reeleição de Nicolás Maduro, o regime expulsou o pessoal diplomático argentino do país. A ditadura tentou retirar a gestão brasileira do prédio, mas Brasília se opôs.
“Em múltiplas gestões, desde a entrada dos cidadãos venezuelanos na embaixada da Argentina [o que se deu em março passado], o assunto foi tratado pelo ministro das Relações Exteriores, embaixador Mauro Vieira, com seu homólogo venezuelano”, seguiu Belli.
O diplomata reforçou que a Convenção de Viena, que rege as relações diplomáticas, exige a proteção de locais de missão diplomática mesmo quando há rompimento de relações bilaterais. O direito internacional também prevê que os asilados devem ter permissão para sair do país junto com a missão que os acolhia, o que a Venezuela impediu.
Mais de uma vez o Brasil ofertou enviar um avião para buscar os seis asilados. São pessoas do alto escalão da oposição, como a diretora de comunicação, Claudia Macero, e o principal nome de política exterior, Pedro Urruchurtu Noselli, ambos figuras muito próximas à líder opositora María Corina Machado.
Nestas três semanas, os asilados relataram que o regime cortou o fornecimento de energia elétrica. A sede, no entanto, tem gerador próprio. A reportagem também ouviu de interlocutores brasileiros que agentes do regime impediram entregas por delivery de alimentos e medicamentos no prédio da embaixada.
A relação bilateral entre Brasil e Venezuela se deteriorou após o governo Lula (PT) ser protagonista do impedimento de entrada da ditadura no Brics. Brasília trabalha nos bastidores para manter linhas de contato, e o discurso linha-dura do regime contra figuras do governo brasileiro, entre elas Celso Amorim, refluiu no último mês.
Por cautela e por ser um dos únicos países democráticos das Américas que ainda tem sua equipe diplomática em solo venezuelano, o Brasil não se somou a uma declaração conjunta sobre o tema que uniu Argentina, Canadá, Chile, Costa Rica, EUA, Guatemala, Haiti, Panamá, Peru, Suriname, República Dominicana e Paraguai.
Na abertura da sessão, o chanceler argentino, Gerardo Werthein, que falava por videochamada, pediu que os países-membros da OEA ajam de alguma maneira e de forma urgente. “Aceitaremos que seis pessoas cuja única culpa foi exercer o direito à dissidência passem por isso? Vamos atuar agora ou esperaremos uma tragédia? A história nos julgará não apenas pelo que fazemos, mas pelo que deixamos de fazer. A indiferença é cúmplice da arbitrariedade.”
Em setembro, o regime de Maduro produziu assédio semelhante ao prédio da embaixada. Como se tornou público depois, a pressão teve o efeito prático de acelerar a decisão de Edmundo González, o nome que a oposição, projetos de contagem de votos e países como os EUA dizem que foi o verdadeiro eleito, saísse do país para se exilar na Espanha.
De Madri, González tem dito que voltará à Venezuela para tomar posse em 10 de janeiro, uma afirmação que muitos têm dificuldade de ver se materializando. Agora, tem dito também que María Corina Machado, a líder opositora impedida de concorrer, será sua vice-presidente.
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