O jogo “vinho nacional versus vinho importado” está virando. Se até pouco tempo atrás quase 100% dos consumidores do país torciam o nariz para o vinho brasileiro, hoje é cada vez mais comum encontrarmos bebedores experientes que se dizem fãs dos vinhos produzidos por aqui. Gente que procura por rótulos brasileiros, sabe e acompanha a história dos produtores, visita às vinícolas e compra seus vinhos preferidos sem se importar muito com os preços e, principalmente, sem comparar esses preços com os dos vinhos importados.
Os restaurantes, por sua vez, começam a dar destaque para a produção nacional. Na penúltima semana de maio, estive no jantar de lançamento da carta de vinhos nacionais do grupo de churrascarias de alto padrão NB Steak, que tem 10 casas, sendo uma em Goiânia, duas em Porto Alegre, uma em Campinas e seis na capital paulista. A carta foi criada pelo jornalista e sommelier Stévão Limana.
Stévão é um jornalista de política, atualmente cobre o governo paulista na CNN, mas escreve e faz várias reportagens também sobre vinhos. Como todos os jornalistas de vinhos, é uma pessoa que vejo com bastante frequência. Eu já sabia do entusiasmo dele pelo vinho brasileiro. É alguém que conhece bem a produção nacional.
Montou uma carta interessante, com pequenos produtores gaúchos tradicionais, como a Vinícola Dom Cândido, do Vale dos Vinhedos, e a vinícola Don Giovanni, de Pinto Bandeira, mas também com nomes novos, como a Garbo Enologia Criativa, de Bento Gonçalves, na Serra Gaúcha, e a Vinícola Bebber, da região de Altos Montes, no município de Flores da Cunha, também na Serra Gaúcha.
Trouxe ainda produtores das novas regiões vinícolas. Do Sul de Minas Gerais, entraram dois rótulos da Vinícola Bárbara Eliodora e, de São Paulo, dois rótulos da Vinícola Terras Altas. No total, são 27 vinhos, sendo dois espumantes, três brancos e 22 tintos – o que faz todo sentido porque estamos falando de uma casa de carnes.
Os preços variam entre R$ 80,00 e R$ 350,00, tendo um bom número de opções na casa dos cento e poucos. O NB Steak continua mantendo uma carta de vinhos importados. A carta só de brasileiros, no entanto, sempre será apresentada aos clientes junto com a outra. Assim, os brasileiros ganham um destaque.
Estou curiosa para saber a reação do público. Entre os que estavam no jantar do qual participei, a repercussão foi ótima. Claro, a maioria já foi com disposição para isso. O empresário Marcelo Fernandes, proprietário dos restaurantes Kinoshita, Mercearia do Francês e Foglia Forneria, por exemplo, mencionou que pretende aumentar o número e dar destaque aos vinhos nacionais nas cartas de suas casas.
São Paulo, já tem uma experiência bem sucedida de um restaurante que aposta nos vinhos nacionais. No restaurante Esther Rooftop, do chef francês Benoit Mathurin, a carta montada exclusivamente com vinhos brasileiros tem feito sucesso. Segundo o chef, muitas pessoas já saíram convertidas de seu restaurante. Entraram reclamando da falta de vinhos estrangeiros e saíram encantadas com o vinho nacional. Há também a Enoteca Nacional, um bar de vinhos só com rótulos brasileiros que vive cheio.
Nada disso seria possível anos atrás. Em 2012, quando inaugurou, o Hotel Botanique, de Campos do Jordão, na época alardeado como o mais caro do Brasil, fez uma carta só de vinhos nacionais. Alguns meses depois da inauguração, no entanto, a direção teve de ceder à pressão de hóspedes (que esperavam encontrar num hotel como aquele champanhes, bordeaux, borgonhas, etc) e criou uma carta internacional.
Não faz muito tempo, os chefs e até os sommeliers tinham preconceito contra o vinho brasileiro. Agora abraçam a causa. Nos restaurantes mais caros e premiados, é comum encontrar uma boa curadoria de vinhos brasileiros. No menu degustação harmonizado do D.O.M, por exemplo, na noite em que estive lá, de nove vinhos, só um era estrangeiro.
Se seguirmos nessa toada, em breve, as novas gerações nem vão saber que, um dia, houve pessoas que se recusavam a beber vinho nacional.
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