O retorno de Donald Trump à presidência dos EUA está provocando mudanças significativas na geopolítica internacional, com possíveis efeitos de longo prazo. A tensa reunião desta sexta-feira (28) entre Trump e o presidente ucraniano Volodymyr Zelensky, na Casa Branca, evidenciou divergências sobre a guerra na Ucrânia, que foi desencadeada há três anos pela invasão russa. A reunião também revelou uma pequena parte dos impactos dessa nova dinâmica americana no cenário global.
Zelensky chegou ao encontro com o objetivo de garantir o apoio contínuo dos EUA, essencial para sustentar a resistência contra a ofensiva russa. Entre suas prioridades estavam:
- Manter a ajuda militar e financeira dos EUA.
- Garantir o fornecimento de armas e suporte logístico.
- Reforçar o compromisso americano com a pressão diplomática sobre a Rússia.
- Evitar acordos de paz que comprometessem a soberania ou resultassem em concessões territoriais à Rússia.
Por outro lado, Trump tinha intenções diametralmente opostas. Seu foco era pressionar Zelensky a aceitar um acordo de paz que incluísse concessões territoriais significativas, além de reduzir a dependência ucraniana de ajuda militar e financeira americana. Essa postura reflete a visão de Trump de priorizar interesses domésticos, minimizando o custo do envolvimento dos EUA em conflitos externos.
A estratégia de Trump dá ênfase a uma abordagem de curto prazo e transacional na política externa. O modelo propõe acordos rápidos, que frequentemente sacrificam alianças tradicionais e compromissos de longo prazo. A ação busca alinhar-se a promessas eleitorais internas, como a redução da presença americana em cenários globais e liberação de recursos para serem aplicados em necessidades internas nos Estados Unidos.
A tensa reunião, marcada por desentendimentos entre os presidentes, poderá impactar significativamente a guerra na Ucrânia e afetar, no longo prazo, as relações EUA-Europa e a influência dos regimes autoritários russo e chinês no mundo.
Revés diplomático para Zelensky fortalece a Rússia na guerra na Ucrânia
A mídia internacional e analistas de geopolítica apontam que a reunião foi amplamente considerada desastrosa para Zelensky. Trump adotou uma postura assertiva e pouco convencional na diplomacia, defendendo concessões à Rússia e expressando uma posição de menor apoio à Ucrânia. Zelensky rejeitou essas condições, que devem aumentar as dificuldades diplomáticas e militares para Kiev.
A tradicional revista britânica The Economist classificou o episódio como um golpe significativo para a credibilidade de Zelensky, ao mesmo tempo em que enfraqueceu a posição da Ucrânia diante da Rússia. Já o Washington Post destacou que o episódio também expôs a falta de coesão entre os aliados ocidentais. O primeiro-ministro da Hungria, Viktor Orbán, já descreveu essas diferenças como “intransponíveis”.
A alteração na política americana, liderada por Donald Trump, tem consequências diretas para a continuidade da guerra na Ucrânia. Sem o suporte robusto dos Estados Unidos, Kiev enfrentará crescentes desafios para resistir à ofensiva russa. A recusa de Trump em ampliar a ajuda militar e financeira mina significativamente a capacidade ucraniana de se opor às investidas de Moscou.
Além disso, a desarticulação entre os aliados ocidentais dificulta a construção de uma estratégia conjunta contra a Rússia. A falta de coordenação aumenta a pressão sobre a Ucrânia, criando um cenário em que medidas unilaterais e acordos desfavoráveis passam a ser alternativas mais prováveis.
A possibilidade de Kiev ser compelida a aceitar um acordo que beneficie a Rússia tornou-se mais evidente. Tal acordo consolidaria os ganhos territoriais de Moscou e prejudicaria gravemente a soberania ucraniana, alcançando um dos principais objetivos estratégicos de longo prazo do Kremlin. A percepção de que os EUA estão se afastando também desestimula potenciais apoios de outros países, agravando o isolamento geopolítico da Ucrânia.
A postura de Trump também afeta profundamente as relações entre os Estados Unidos e seus parceiros europeus. Muitos líderes na Europa enxergam o recuo americano como um sinal de fragilidade e abandono, aumentando as divisões internas na União Europeia. Países como Alemanha e França, que geralmente lideram os esforços diplomáticos continentais, encontram dificuldades para substituir a posição dos EUA como um contraponto forte à influência russa.
Essa fragmentação enfraquece o bloco europeu em momentos críticos, criando um vácuo de liderança que ameaça não apenas a unidade ocidental, mas também a estabilidade global na gestão do conflito Rússia-Ucrânia.
Mudança nos EUA abre mais espaço para Putin no cenário internacional
A mudança na política externa dos Estados Unidos, exemplificada pelo embate entre Donald Trump e Volodymyr Zelensky, abre espaço para dois grandes vencedores no cenário internacional a longo prazo: os ditadores Vladimir Putin, da Rússia, e Xi Jinping, da China.
A postura de Trump foi celebrada pelo Kremlin e pela mídia russa, que é pró-Putin. O encontro foi considerado como uma vitória para Moscou. O governo russo utilizou o embate para reforçar sua narrativa de que a Ucrânia está isolada e que os aliados ocidentais estão fragmentados.
A abordagem americana fortalece Vladimir Putin, não apenas ao enfraquecer a moral ucraniana, mas também ao limitar a capacidade da União Europeia em procurar uma solução para o conflito.
Analistas ouvidos por veículos como The Economist e Bloomberg destacam que a redução do engajamento americano no Leste Europeu oferece a Putin oportunidades para expandir a influência russa no continente. Relações estreitas com aliados estratégicos como Hungria e Sérvia reforçam o posicionamento do Kremlin, enquanto a ausência de uma liderança coesa do Ocidente permite à Rússia consolidar seus avanços territoriais e políticos.
Especialistas avaliam que, a longo prazo, Moscou tem potencial para fortalecer sua posição global, consolidando-se como uma potência assertiva capaz de moldar a ordem internacional em favor de seus interesses estratégicos.
China também ganha oportunidades
Enquanto Trump reposiciona os EUA no cenário internacional, a China explora o vácuo de liderança americana para expandir sua influência global. Iniciativas como a Nova Rota da Seda (Belt and Road Initiative) procuram a presença econômica chinesa em regiões estratégicas como África, América Latina e Sudeste Asiático. A atuação também é feita em outras esferas como a diplomática e a cultural.
O gigante asiático busca consolidar sua imagem de estabilidade e fortalecer parcerias estratégicas para ampliar sua influência no cenário internacional, alinhando seus interesses de curto e longo prazo.
A Bloomberg aponta que Trump estaria “perdendo para Xi Jinping” no “campo das ideias globais”, e o comportamento dos EUA reforça a narrativa chinesa de que são um parceiro imprevisível e pouco confiável. Isso permite a Pequim destacar-se como uma opção estável e multilateral, atraindo países interessados em relações duradouras.
Além disso, a China passa a ganhar mais espaço em fóruns globais e na discussão de temas globais, como as mudanças climáticas.
Pequim pode obter alívio em questões sensíveis, como direitos humanos, especialmente os relacionados a repressão aos muçulmanos em Xinjiang; a independência de Taiwan e às dispustas no Mar do Sul da China. Segundo a Bloomberg, a postura de Trump dá à China mais espaço para reforçar sua posição como potência asiática dominante.
Trump pode ter benefícios internos no curto prazo
Especialistas apontam que a estratégia de Trump apresenta pontos positivos, principalmente no curto prazo. Ao reduzir a participação em conflitos externos, os Estados Unidos podem redirecionar recursos para prioridades internas, como economia e infraestrutura. A abordagem também tem o potencial de acelerar negociações e evitar os impasses típicos da diplomacia tradicional.
No entanto, os riscos são claros. Uma política centrada exclusivamente em interesses imediatos pode comprometer alianças estratégicas e debilitar a posição americana no longo prazo. A desconfiança gerada pela imprevisibilidade de Trump pode afastar parceiros importantes e criar um vácuo de liderança que outras potências, como Rússia e China, não hesitarão em preencher.
Os analistas avaliam que o ponto fraco abordagem de Trump é sua visão transacional da política externa, que desconsidera a relevância de alianças duradouras e cooperação multilateral, que podem ser indispensáveis para enfrentar desafios globais como mudanças climáticas, terrorismo e pandemias.
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