O paulista Fábio Melchíades, uma dessas pessoas que não se contentam em beber vinho, que querem saber tudo sobre como ele é feito, um dia esbarrou com a informação de que há 8 mil anos na Geórgia, país do Cáucaso tido como o berço da vitivinicultura, os vinhos eram (e continuam sendo) feitos em ânforas de cerâmica. “A primeira coisa que passou pela minha cabeça foi: cerâmica é a minha especialidade”, lembra o engenheiro de materiais e proprietário de uma indústria de pisos cerâmicos em São Carlos, no interior de São Paulo. A segunda foi “vou fazer uma ânfora”.
De início, Fábio pensou em construir um protótipo pequeno, comprar umas uvas e testar o equipamento ele mesmo. Procurou, então, o enólogo chileno Cristian Sepúlveda, proprietário da vinícola Terra Nossa, de Espírito Santo do Pinhal, também no interior de São Paulo (não muito longe de São Carlos), para comprar uvas.
“Eu não vendo uvas”, diz Cristian. “Mas, quando ele me falou do projeto das ânforas, me interessei. Nós estávamos mesmo buscando materiais novos para testar na vinificação. Então, o desafiei a construir uma ânfora grande, profissional”. Isso era fevereiro de 2023. O enólogo não apenas lançou o desafio. Ele ajudou o engenheiro com informações sobre as especificações técnicas necessárias para o equipamento e indicou fornecedores de acessórios como travas, tampas e válvulas.
Fábio, por sua vez, pesquisou o que havia de mais moderno na Europa e no Novo Mundo. Investigou quais seriam os materiais à disposição. Desenhou o projeto. E construiu a peça. Assim nasceu a Badicier Ânforas Cerâmicas, que lançou sua primeira ânfora em julho de 2024. Até o momento, a empresa já construiu nove peças de 350 litros. Essas encontram-se espalhadas por seis vinícolas do Brasil: Terra Nossa e Entre Vilas, de São Paulo; Casa Geraldo, de Minas Gerais; a Mello Vinícola, de Pernambuco; a Era dos Ventos e a Angheben, do Rio Grande do Sul.
Os primeiros vinhos estão chegando agora ao mercado. Eu ainda não provei nenhum. Não sei dizer que apito tocam. Tanto o Fábio quanto o Cristian garantem que a ânfora não transfere aromas para os vinhos. À diferença das talhas de Portugal ou das tinajas chilenas, na maioria, de argila vermelha, que muitas vezes transmitem aromas terrosos (por causa do óxido de ferro) ou resinosos (da cera de abelha usada para impermeabilização) para o líquido, as ânforas paulistas são super high tech, feitas de uma composição de argilas brancas, inertes, com a porosidade controlada, que não precisam de impermeabilização.
Sua função principal é a micro oxigenação. Segundo Cristian, a passagem por esse tipo de ânfora ressalta a fruta e traz frescor aos vinhos. “Ainda é cedo para dizer exatamente como ela age e qual o resultado final”, diz. “O Profana Ânfora, nosso syrah, ainda está na ânfora. Até agora parece que ficará estupendo. O melhor de tudo: é um vinho original. Feito com uvas plantadas em São Paulo, vinificado em São Paulo, num equipamento fabricado dentro do estado, usando argila paulista. É exatamente isso que estamos buscando. Originalidade. “
Se os resultados forem tão bons quanto prometem, ainda vamos ouvir falar muito da Badicier Ânforas Cerâmicas. Há muitas vinícolas sendo construídas no Brasil. Só na região de Espírito Santo do Pinhal, Cristian calcula que existam hoje 80 projetos em diferentes estágios de andamento. Há ainda várias outras regiões novas no sudeste e no centro do país. Começar a produzir também equipamentos de vinicultura é o caminho natural para esses terroirs em construção..
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