Eu procurava alguns últimos presentes de Natal para meus amigos quando encontrei a melhor coisa que poderia dar para mim mesmo. Era um caderno simples, páginas em branco, sem pauta, sem nada, mas com esta frase escrita na capa: “Eu serei outro lugar”.
Inicialmente pareceu-me apenas uma provocação interessante. Se eu fosse um pouco mais esotérico ficaria desconfiado das pessoas por trás daquela papelaria, que se chama apenas Papelaria. Como eles sabiam que essa era exatamente a mensagem que eu precisava para abrir 2025?
Eu, você, nós que gostamos de viajar, sempre começamos o ano perguntando: “para onde agora?”. Várias publicações de turismo exibem agora suas listas de “destinos dos sonhos”, “últimas fronteiras”, “experiências transformadoras”. Não escapei deste exercício.
À meia-noite do 31 de dezembro repeti uma antiga superstição, que já contei em várias entrevistas: bem na virada do ano, logo após desejar “Feliz Ano Novo” a quem está em sua volta, você deve pegar uma mala, ainda que de mão e dar uma volta com ela, vazia mesmo, em torno da casa onde está.
Pode ser em torno do quarteirão, se estiver em um prédio, ou ainda pelo interior de onde você festeja a passagem de ano. Como toda boa superstição, você pode adaptá-la conforme suas necessidades. E quando alguém me pergunta se isso funciona mesmo eu simplesmente mostro meu passaporte.
Neste Réveillon em Paris, onde passei a virada do ano, não foi diferente, mesmo diante de temperaturas glaciais. E ao fazer o percurso, tinha em mente alguns lugares que eu queria conhecer em 2025: Polônia, República do Congo, Fernando de Noronha, Eslovênia, Groenlândia, Serra da Capivara (PI)…
Mas o que aquela frase na capa do caderno queria comigo era de outra ordem. Quando li “Eu serei outro lugar”, senti que a tal provocação não era para buscar destinos específicos por esse mundo, mas para olhar dentro de mim e pensar: “Quem é esta pessoa que quer tanto viajar?”.
O ponto de partida dessa inquietação era que em 2025, quando completo 62 anos, eu ainda não tenho uma boa reposta para essa pergunta. Quem é exatamente esse alguém que se recusa a ficar num só lugar? Se acaso você se identifica com essas questão, vamos a uma breve exploração do tema.
Nas quatro palavras que, como descobri depois, o grande artista e fotógrafo Felipe Morozini, ali estampou em colaboração com a Papelaria, estava contido um desafio quase existencial: onde devo buscar mais de mim?
Relaciono-me com esse mundo incrível desde que pus o pé fora de casa, ainda criança. Das viagens na infância de São Paulo a Uberaba (MG), minha terra natal, às quatro voltas ao mundo, eu estou sempre procurando outros lugares. E encontrá-los nunca parece o suficiente.
É como se um destino cumprido fosse nada mais que um estímulo para que eu seguisse adiante, em busca de novos horizontes. Longe de ser uma maldição sôfrega, porém, esse assanho é o mais generoso dos combustíveis.
Olhando os meses que temos pela frente, não os vejo apenas como pontos a serem marcados com um alfinete no mapa, mas como possibilidades de reinvenção deste que sempre está com uma mochila nas costas. E que delícia que é se sentir inquieto assim diante de 2025.
O ano em que serei outro lugar.
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