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Mesmo após destravar o pagamento de R$ 7,661 bilhões em emendas parlamentares na segunda-feira (16), o governo de Luiz Inácio Lula da Silva (PT) não tem garantias de aprovar na íntegra o pacote fiscal enviado ao Congresso.

A expectativa é de que Câmara e Senado consigam votar até sexta-feira (20) – quando em tese termina o calendário do Congresso – apenas duas das três propostas legislativas que compõem o pacote. A Fazenda afirma que o pacote completo assegura economia de R$ 70 bilhões aos cofres públicos nos próximos dois anos.

A semana é decisiva para a pauta econômica do governo. A pressa do Executivo foi a oportunidade vislumbrada pelos parlamentares para a barganha do pagamento dos recursos, suspenso em agosto por decisão do ministro Flávio Dino, do Supremo Tribunal Federal (STF). O repasse foi liberado após portaria editada pelo governo.

“O pacote de ajuste fiscal, que chamo de pacotinho, é claramente insuficiente e deve passar porque, apesar da necessidade de cortes mais profundos, parlamentares estão condicionando a votação à liberação de emendas, o que é lamentável”, disse o senador Oriovisto Guimarães (Podemos-PR), em entrevista à TV Senado, nesta terça-feira (17).

Mesmo com a liberação, há pontos de impasse e a discussão promete ser intensa. Algumas das propostas são vistas como impopulares e sofrem resistências dos parlamentares. O PT, por exemplo, se opõe às mudanças no reajuste do salário mínimo e nas regras do abono salarial e do Benefício de Prestação Continuada (BPC). Parlamentares do centro resistem a arcar com o ônus da aprovação, uma vez que o partido do próprio presidente se recusa a fazer.

Em coletiva, o presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), afirmou que os projetos do pacote que tratam do salário mínimo e do abono salarial serão votados nesta quarta-feira (18).

Lula também resistiu o quanto pôde às medidas de ajuste, mas sua preocupação, agora, é evitar que o pacote saia ainda menor do que quando entrou. Vale lembrar que as medidas foram consideradas fracas pelo mercado financeiro e insuficientes para alterar a trajetória da dívida pública.

O ministro da Fazenda, Fernando Haddad, disse na segunda que o chefe do Executivo vai se envolver diretamente na articulação junto à Câmara dos Deputados para a aprovação. “O apelo que ele [Lula] está fazendo é para que as medidas não sejam desidratadas”, relatou o ministro, após se encontrar com Lula em São Paulo, onde o presidente se recupera das cirurgias da semana anterior. “Nós temos um conjunto de medidas que garantem a robustez do arcabouço fiscal”, completou.

Pacote inclui dois projetos e uma PEC

Entre as três propostas que compõem o pacote, há um projeto de lei, um projeto complementar e uma proposta de emenda à Constituição:

• O PL 4.614/2024 altera a regra de correção do salário mínimo, ajustando-a ao arcabouço, que prevê aumento de despesas na faixa entre 0,6% e 2,5%. Assim, o salário mínimo ainda teria ganho acima da inflação, mas dentro do limite da regra fiscal. O líder do MDB na Câmara, Isnaldo Bulhões (AL), é o relator.

• O PLP 210/2024 autoriza o governo federal a limitar o uso de créditos tributários em caso de déficit nas contas públicas. A matéria, relatada pelo deputado Átila Lira (PP-PI), altera trechos do arcabouço fiscal.

• A proposta de emenda à Constituição (PEC 45/2024) trata de vários temas, como limites ao pagamento de benefícios acima do teto salarial do funcionalismo público; a limitação na concessão, ampliação ou prorrogação de incentivos fiscais; mudanças nas regras de acesso ao abono salarial; e mudanças no BPC, pago a deficientes e pessoas idosas de baixa renda. O relator da proposta é Moses Rodrigues (UB-CE).

As duas primeiras são as que têm mais chances de serem votadas. A PEC, admitem aliados do governo, deve ficar para 2025, já que a tramitação é longa. Além de precisar ser admitida pela Comissão de Constituição e Justiça (CCJ), o mérito da proposta precisa ser analisado por Comissão Especial. A votação ocorre em dois turnos. Se passar pela Câmara, segue para o Senado, onde fará o mesmo caminho. Para ser aprovada, precisa do voto de três quintos dos membros (308 deputados ou 49 senadores) em cada turno.

Liberação de emendas facilitou votação

Antes da liberação das emendas, Arthur Lira chegou a cravar que o governo “não tem votos” para aprovar o pacote fiscal. A aprovação do regime de urgência das medidas foi aprovada por uma diferença de apenas três votos.

Na reunião que teve com Lula em 10 de dezembro, antes da hospitalização de emergência do presidente e após o acordo para a liberação de emendas, Lira se comprometeu em ter “celeridade e boa vontade” na análise dos projetos do pacote fiscal.

No mesmo dia, o governo publicou uma portaria conjunta, que, na prática, viabilizou o pagamento de emendas este ano. O texto foi divulgado em uma edição extra do Diário Oficial da União (DOU) e abrange recursos do orçamento de 2024 e de restos a pagar de anos anteriores.

O documento incorpora parte das regras de transparência determinadas pelo ministro Flávio Dino. Mas trouxe uma interpretação própria das decisões do STF sobre o tema, dando diretrizes para gestores públicos pagarem as emendas neste ano e a partir de 2025. Na prática, foi uma manobra para contornar trechos do que a Corte validou.

Parlamentares querem mais para votar pacote de gastos

As emendas liberadas na quinta-feira (12) e sexta-feira (13) são individuais – indicadas por cada deputado e senador no Orçamento para seus redutos eleitorais – e de bancada, aquelas destinadas ao conjunto de parlamentares de cada estado. São também impositivas, ou seja, o governo é obrigado a liberar conforme a indicação dos congressistas.

Mas há R$ 8 bilhões em emendas de comissão, remanescentes do chamado “orçamento secreto” do governo anterior, que ainda não foram pagas. No Congresso, Lira e o senador Davi Alcolumbre (União-AP), presidente da CCJ, controlam o dinheiro. O STF determinou ao governo pagar somente as emendas que tiverem os padrinhos identificados.

O Supremo estabeleceu também que as comissões se reunissem para decidir a destinação das emendas, indicando cidades e parlamentares atendidos. Lira, no entanto, suspendeu o funcionamento das comissões da Casa para dar prioridade ao plenário.

A informação que circula no Congresso é que o governo só vai pagar as emendas de comissão após o encerramento dos trabalhos do Legislativo, na sexta-feira. Deputados e senadores, segundo apurou o Estadão, ficaram incomodados e mandaram ofícios para o governo identificando as emendas a que têm direito.

Isso seria outro ponto de entrave para a aprovação da pauta econômica. Também precisa ser votada nesta semana a Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO), que autoriza o governo a gastar cada centavo do caixa da União, e a Lei Orçamentária Anual (LOA), que determina para onde vai o dinheiro.

Na tarde desta terça-feira (17) aconteceu a discussão da LDO pela Comissão Mista de Orçamento (CMO), mas a PLOA não tem garantia de votação e pode ficar para 2025. O senador Angelo Coronel (PSD-BA) disse que o atraso é culpa do governo, que demorou a enviar o pacote do corte de gastos ao Congresso. Ele explicou que o salário mínimo, que precisa ser incluído na lei, ainda não está definido na peça orçamentária.

“Hoje nós estamos com dilema. Pelas regras atuais, nós vamos a R$ 1.528 [de salário mínimo] e pelo pacote a R$ 1.518. Uma diferença de R$ 10 que representa aí realmente uma grande soma de R$ 7 bilhões ao ano [pela indexação dos benefícios pagos]”, explicou Coronel em entrevista à GloboNews nesta terça. “Então o Congresso não pode ficar com a culpa se a pauta não está andando. Porque não houve celeridade por parte do governo para mandar o pacote.”

Segundo o relator, a PLOA está pronta desde agosto, “quando o dólar estava cotado a R$ 5,20 e agora está a mais de R$ 6”. “Estamos na economia muito flutuante. Este corte [de gastos] deveria ter sido feito com antecedência, não ao apagar das luzes do recesso parlamentar”, afirmou.

“Querem aprovar um pacote numa folga de três dias úteis. Nós ainda vamos ficar até sexta-feira ou até segunda-feira, se possível for, numa convocação extraordinária para que a gente faça a nossa parte. Agora eu quero repetir, enfatizar que não se pode responsabilizar o congresso, que está pronto para votar o orçamento. A culpa não é nossa.”



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