Sentado no bar do restaurante Parigi, Gero Fasano, 63, pergunta ao garçom o que havia disponível para beber naquela noite. Em taça, só vinho argentino ou chileno, o funcionário responde. “Pelo amor de Deus, um gim-tônica”, diz o restaurateur, ao lado do amigo Márcio Alemão, roteirista e publicitário.
A provocação sobre a produção vinícola vizinha ao Brasil, registrada na conta de Gero no Instagram (@gerofasano) e YouTube, tem a intenção de fazer rir, diz o empresário à frente de hotéis e restaurantes em cidades como São Paulo, Rio de Janeiro, Punta del Este e Nova York.
O vídeo faz parte de um conjunto com outras gravações, de tom entre o bem-humorado e o franco, que o restaurateur decidiu fazer para falar o que pensa sem estar atrelado a programas de TV ou entrevistas.
“Mas falta aí de fato uma explicação”, afirma Gero sobre a taça de vinho chileno e argentino que recusou. “Dizer que eles [os rótulos] são péssimos não é verdade. Porém tem uma questão que pra mim é verdade. Por que eu não os tomo? Porque culturalmente [no Chile e Argentina] não deixam envelhecer o vinho”, diz.
Sua preferência, explica, é pela bebida sem taninos (substância presente no vinho tinto que provoca a sensação de secura ou adstringência) potentes, comuns em vinhos jovens. Ele gosta dos mais antigos, como os que encontra em enotecas no Velho Mundo com safras de 2010, 2000 e até 1980.
“Na América do Sul tem essa cultura, porque consideram vinho tinto uma coisa para comer com churrasco, com aquela cor vermelha de suco de uva.”
O restaurateur sempre fica de escrever “uma colinha” para gravar os vídeos —mas não o faz porque sabe que não seguiria o roteiro no final. Também por isso avisou a equipe de filmagem que a meta é acertar de primeira.
“Já fui muito fotografado. O cara te pede um sorriso, e, se for lento, no quinto ele já está amarelo. Se tiver que repetir pela terceira vez [a gravação] eu prefiro eliminar e seguir para outro tema.”
Um desses vídeos cuja produção fluiu comenta um preparo do chef Gordon Ramsay, conhecido por apresentar “Hells Kitchen”. Nele, o chef ensina uma receita de carbonara com ervilha, cream cheese e champinhom. Gero, em sua gravação, diz, de forma espirituosa, que é inadmissível o cozinheiro inglês chamar aquele prato de verdadeiro carbonara.
“Na minha opinião tem coisas que não pode”, diz Gero. “Me irrito um pouco com algumas aberrações. Eu sou purista. Ele [Gordon Ramsay] pode chamar o prato de espaguete da ‘minha nona’. Mas não chama de “real carbonara” [carbonara verdadeiro]. Ele é muito importante para ensinar errado”, diz o restaurateur.
Outros exemplos de aberrações, segundo ele, são tiramissu feito com cream cheese (“chama de pavê”), risoto feito com creme de leite (e não seguindo a técnica de combinar manteiga e parmesão para dar cremosidade) e, por fim, vinho tinto servido a 16ºC.
“É outra coisa polêmica, um modismo, vejo muita gente falando e está virando uma verdade. Na Itália ninguém gela o vinho tinto”, diz. E se o cliente pedir no restaurante um balde para colocar o rótulo? “Eu acho um absurdo. Mas é o gosto do cara. Não me cabe ficar julgando.”
Além de refletir sobre a gastronomia e personalidades que orbitam no meio —como chefs de reality shows— Gero também fala de forma aberta sobre a profissão em um dos vídeos. “Você sabia que você vai trabalhar à noite, e a noite é cheia de armadilhas?”, diz a gravação. Gero explica que decidiu fazê-la pensando em quem quer entrar no setor mas não conhece meandros “que nenhuma faculdade vai explicar”. Ele mesmo, diz, não sabia no começo.
“Meu pai quase me expulsou de casa quando disse que queria seguir a profissão do meu avô. Ele me disse que foi filho de dono de restaurante e que eu iria chegar em casa 2h da manhã e trabalhar no Natal”, conta Gero, fora das telas. E, afinal, a previsão não estava de todo errado.
“Eu posso dizer que eu fui muito louco. Ia dormir 5h da manhã quase todo dia. Eu detonei um fígado e tive um infarto.” Foi o resultado do esforço para acompanhar de perto os negócios. Para tanto, ele tinha uma moto e transitava durante o dia entre eles para conversar com maîtres. “Isso tudo é tenso. Isso tudo é nervoso.”
No fim do dia, apesar da exaustão, era preciso baixar a adrenalina. “Você vai começar a fazer o quê? Sair 1h da manhã, tomar um drinque. E, quando viu, caiu numa roda viva em que são esses os seus amigos.”
Aos 43 anos de profissão, hoje Gero tem uma equipe que o permite ir para casa um pouco mais cedo. “Soube que vou ser avô e vou comemorar na Sicília.” Os vídeos, espontâneos, continuam na sua volta. “Não quero nada que vire obrigação. Se ontem vi algo e me deu vontade de falar, aviso a equipe e gravamos”, diz.
De preferência, em um take.
Deixe um comentário