As mudanças climáticas não são previsões futuristas. Segundo o Cemaden (Centro Nacional de Monitoramento e Alertas de Desastres Naturais), em 2023 foram 1.161 desastres com impacto econômico superior a R$ 25 bilhões em áreas públicas e privadas, além de mais de R$ 5 bilhões em obras de infraestrutura.
A questão que se apresenta é como os contratos de concessão, especialmente os de infraestrutura, devem se modificar para refletir essa nova realidade que requer ações mitigadoras.
Enquanto avanços não forem implementados, as partes envolvidas devem ajustar suas expectativas e responsabilidades nos contratos vigentes. Os conceitos tradicionais de imprevisibilidade para caso fortuito e força maior precisam ser revisitados. Com a frequência e regularidade crescentes de eventos extremos, torna-se impossível tratá-los como totalmente imprevisíveis.
As ciências climáticas nos fornecem ferramentas para prever e minimizar danos e prejuízos, o que deve ser refletido nos contratos atuais de concessão que frequentemente abordam eventos climáticos como força maior, permitindo a recomposição do equilíbrio econômico-financeiro original. Isso exime, normalmente, os concessionários de responsabilidades que não podem ser seguradas, transferindo os custos para o setor público.
Com o avanço das ciências climáticas, não é mais aceitável alegar surpresa diante de tais eventos, devendo-se buscar soluções dentro dos próprios contratos, além dos mercados de seguros.
É essencial reavaliar a matriz de risco nos contratos de concessão para adequar a alocação de responsabilidades.
A previsibilidade dos eventos climáticos extremos requer uma releitura dessa matriz, que deve incorporar e compartilhar os riscos associados. Estudos de viabilidade e precificação de ativos e obrigações devem incluir os efeitos negativos das mudanças climáticas, em vez de repassá-los ao poder público.
Para contratos em andamento, a realidade climática pode ser abordada por meio de aditivo que defina responsabilidades compartilhadas em relação a eventos não contemplados nos acordos originais. Além disso, medidas mitigadoras devem ser aprimoradas para fortalecer a resiliência das estruturas e serviços aos impactos climáticos.
Para contratos futuros, é imprescindível que a matriz de risco seja elaborada com base na ciência vigente, envolvendo a inclusão explícita de eventos extremos como riscos compartilhados e a previsão de medidas adaptativas, como infraestruturas resilientes e seguros obrigatórios.
Com as enchentes gaúchas, o reequilíbrio cautelar concedido pela Anac (Agência Nacional de Aviação Civil) para mitigar os impactos econômicos sinalizou que esse modelo de alocação de riscos precisa ser reavaliado.
É vital estabelecer um pacto entre o poder público e concessionários, incentivando práticas sustentáveis e de inovações.
A atual era climática exige que contratos promovam uma gestão compartilhada de riscos e ignorar a realidade elevará custos no futuro, impactando toda a sociedade.
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