Durante o Organic Festival Trancoso ou fora dele, a maior parte dos insumos que abastecem a cozinha da Pousada Tutabel, na praia de Itapororoca, a 20 minutos de carro do Quadrado (o centro da cidade baiana), é formada por ingredientes orgânicos.
Boa parte dos legumes, frutas, verduras e raízes que os hóspedes comem no restaurante, no bar da piscina ou no recém inaugurado bar de praia, o Tutabar, vêm de uma horta própria.
Essa horta, no entanto, não é uma hortinha no fundo do quintal, como acontece na maioria dos estabelecimentos que dizem ter produção própria. É um projeto grande, que envolve técnicos e engenheiros agrônomos, além de estufas enormes muito bem montadas, dentro da Reserva Público Privada Natural Rio do Brasil a uns poucos quilômetros da pousada.
O restaurante da pousada, que é exclusivo para hóspedes, tem uma cozinha baiana contemporânea, com um equilíbrio muito bom entre criatividade e confort food. Além disso, eles fazem as mudanças que o hóspede quiser. Há uma série de drinques autorais e uma carta de vinhos com vários nacionais e alguns top franceses.
Já o Tutabar é aberto ao público geral. Ali os clientes se acomodam em ninhos isolados entre a vegetação da restinga ou numas poucas mesas em frente à praia. Ali o forte são os grelhados, com destaque para os frutos do mar.
Fornecer ingredientes de primeira qualidade (mais de 40 itens diferentes) para essa que é uma das pousadas mais exclusivas desse destino que, por si só, já atrai um público de altíssimo poder aquisitivo, não é o único objetivo desse projeto. Gerar soluções ambientalmente sustentáveis que possam ser replicadas pela população local como uma forma de obtenção de renda está entre as suas prioridades.
Assim como a Pousada Tutabel, a Rio do Brasil pertence ao grupo OCanto, que também possui a Pousada Literária, a Fazenda Bananal e a Livraria das Marés, em Parati, e a Pousada Trijunção e a Fazenda Trijunção, na divisa entre Bahia, Goiás e Minas Gerais. Voltado para o mercado de alto luxo, o grupo é bastante envolvido com o turismo regenerativo.
“O turismo regenerativo está um passo além do turismo sustentável”, diz Pedro Treacher, diretor de hospitalidade do grupo OCanto. “Ele se propõe a regenerar o meio ambiente degradado assim como condições socioeconômicas deterioradas. Hoje só o turismo sustentável não é mais suficiente.”
A área de 975 hectares foi comprada pelo grupo depois que já tinha sido transformada em reserva. Ou seja, quando já não era mais possível derrubar uma árvore para construir qualquer instalação turística. Foi adquirida justamente para ser preservada, já que a preservação da RPPNs é por conta dos proprietários. Então, o grupo não visa lucros?
“O lucro faz parte da sustentabilidade de qualquer negócio”, afirma Treacher. “Claro que visamos lucro, mas a relação do negócio com o local é a longo prazo. Não estamos aqui para ganhar dinheiro rápido enquanto o destino está na moda e depois ir embora. Estamos para ficar e queremos melhorar as condições de todos à nossa volta”.
Além da produção de hortaliças, que é feita numa pequena área que já estava desmatada, o grupo aposta na coleta de pancs (plantas alimentícias não convencionais) para usar em seus restaurantes e na venda de experiências dentro da floresta, que está aberta também para quem não é hóspede. São atividades como as trilhas guiadas (a partir R$ 100), a observação de pássaros (a partir de R$ 325) e a descida de caiaque até a praia do rio da Barra, a três horas dali.
O rio do Barra, antigo eio do Brasil, em Trancoso, município de Porto Seguro, Bahia, consta de um dos primeiros mapas do país, o Planisfério de Cantino, de 1502. É o único rio ali desenhado. Aparece bem ao lado da representação de aves que lembram araras e árvores que certamente indicam a presença de uma floresta. Essa floresta, por incrível que pareça, continua em pé. Faz parte da maior porção de mata atlântica que restou no litoral do Nordeste.
Aí está a RPPN Rio do Brasil: um misto de mata primária, mata secundária e em regeneração. Durante o passeio de caiaque, que custa R$ 1.000 para um grupo de quatro pessoas, o guia explica uma série de coisas sobre a fauna e a flora do local.
Em boa parte do trajeto, aquela mais longe da praia, está tudo quase igual ao cenário que a tripulação de Álvares Cabral encontrou, com exceção do pau-brasil. Desse, não restou um para contar a história (pelo menos não na beira do rio). Depois vem o mangue, o jundu e os condomínios de luxo, mas como são de luxo, são cercados de verde e o passeio permanece bonito até à praia. Uma experiência deliciosa!,
A pousada em si já é muito gostosa. Ampla e toda coberta por vegetação nativa. Em um terreno de 88 mil m², são apenas 17 suítes e uma vila. Nunca nada fica cheio. A lotação máxima são 40 hóspedes. Para atendê-los, o hotel mantém 60 funcionários. No entanto, como esses são discretos, você não os vê muito.
As suítes são muito confortáveis com bastante espaço, varanda própria, lençois de linho egípicio, mas o ambiente é rústico, com chão de cimento, muita madeira, janelões de vidro que dão para a mata. Despojadas. As diárias, fora de temporada, começam em R$ 2.235 o casal, com café da manhã incluído. A vila, que, além de duas suítes, tem sala, cozinha e área aberta com piscina privada, tem diárias a partir de R$ 4.740 para quatro pessoas.
À diferença de boa parte dos hotéis de super luxo, no entanto, em todas as suas pousadas, o grupo OCanto estimula que as famílias tragam suas crianças. Há brinquedoteca, sala de TV infantil e, na temporada, até monitores.
“Quando pensamos em quem seria o nosso público,” conta Treacher. “Pensamos que gostaríamos que as pessoas se sentissem como se estivessem na sua casa de praia. Um ambiente onde você tem sua privacidade e pode receber sua família, seus filhos, seus netos. Pensamos que seria um público que gosta de viajar com as crianças e apresentar novas experiências para as crianças”.
Nesse contexto, os monitores não têm a função de distrair as crianças para deixar os pais descansarem em paz. Eles estão lá para criar brincadeiras lúdicas, que envolvam o meio ambiente e a cultura local. Estão lá para formar futuros viajantes com o espírito do turismo regenerativo.
A jornalista viajou a convite do festival
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